Por Tom Ascol
Cristãos que querem se concentrar no evangelho podem facilmente esquecer que o mesmo Deus que nos deu o evangelho também nos deu a sua lei. Essa preocupação é válida, especialmente para os que viveram em épocas em que o evangelho foi negligenciado ou, no melhor dos casos, assumido, e que são naturalmente sensíveis a qualquer coisa que possa competir com a sua importância na vida da igreja. No entanto, nunca podemos honrar o evangelho de Deus desprezando a sua lei.
Na verdade, a falta de clareza sobre a natureza e a importância da lei inevitavelmente resulta em falta de clareza ou até mesmo confusão sobre o evangelho.
Uma compreensão clara da lei de Deus fornece a base para a proclamação do evangelho.
Eu concordo com John Bunyan, que escreveu: “Aquele que não conhece a natureza da lei não pode conhecer a natureza do pecado. E quem não conhece a natureza do pecado não pode conhecer a natureza do Salvador.”
A lei de Deus frequentemente é mal compreendida. Certamente, o medo do legalismo tem muito a ver com isso. Nenhum cristão que acredita na Bíblia quer cometer o erro mortal de pensar que a salvação é de alguma forma alcançada pelos nossos esforços em obedecer aos mandamentos de Deus. Esse é um mau uso da lei que devemos rejeitar, mas sem cair na armadilha de pensar que a lei de Deus é, em si mesma, algo ruim. O apóstolo Paulo diz: “Sabemos, porém, que a lei é boa, se alguém dela se utiliza de modo legítimo,” (1 Timóteo 1:8). Compreender a lei e a forma como Deus pretende que ela funcione é vital para uma vida cristã saudável.
John Newton aponta isso de forma sábia ao observar:
A ignorância da natureza e do propósito da lei está na raiz da maioria dos erros religiosos. Este é o fundamento da auto-justificação, a principal razão pela qual o Evangelho de Cristo não é mais considerado, e a causa da incerteza e inconsistência em muitos, que, embora se apresentem como mestres, não entendem o que dizem nem o que afirmam.
O Deus que nos salva é o mesmo Deus que nos criou e que nos governa. Ele revelou sua vontade para nós em sua lei. Nosso dever, portanto, só pode ser definido em termos do que Ele ordenou.
Obviamente, as Escrituras revelam vários tipos de mandamentos que vieram de Deus. Para entender corretamente nossa relação com tudo o que foi ordenado, devemos fazer distinções, como Paulo claramente faz em Romanos 2:25-27, que diz:
“Porque a circuncisão tem valor se praticares a lei; se és, porém, transgressor da lei, a tua circuncisão já se tornou incircuncisão. Se, pois, a incircuncisão observa os preceitos da lei, não será ela, porventura, considerada como circuncisão? E, se aquele que é incircunciso por natureza cumpre a lei, certamente, ele te julgará a ti, que, não obstante a letra e a circuncisão, és transgressor da lei.”
Historicamente, intérpretes desde Tomás de Aquino até João Calvino, passando pelos Puritanos e pelas Confissões de Fé de Westminster e de Londres (Segunda Confissão) reconheceram uma divisão tríplice nos mandamentos para entender a lei de Deus. Como John MacArthur explica de forma útil:
“Podemos dividir a lei de Deus em três partes: a lei moral, a lei civil e a lei cerimonial. A lei moral era para todos os homens, a lei civil era apenas para Israel, e a lei cerimonial era para a adoração de Israel a Deus. Então, a lei moral abrange todos os homens, é restrita a Israel na lei civil, e à adoração de Israel a Deus na lei cerimonial.”
É essa lei moral que é o padrão imutável de justiça de Deus.
Em outras palavras, Deus e somente Deus tem a autoridade para nos dizer o que constitui justiça e, inversamente, o que é pecado.
Isso é vital para os cristãos lembrarem quando pensamos sobre como as pessoas devem viver. Não somos livres para viver apenas para nós mesmos. Fomos feitos para Deus e devemos amá-lo supremamente acima de tudo. Junto com isso, devemos amar nosso próximo — nossos semelhantes portadores da imagem de Deus—sinceramente.
Como é esse amor? Ele se mostra na obediência aos mandamentos de Deus. Jesus disse: “'Se me amais, guardareis os meus mandamentos.” (João 14:15), e Paulo escreve: “Pois isto: Não adulterarás, não matarás, não furtarás, não cobiçarás, e, se há qualquer outro mandamento, tudo nesta palavra se resume: Amarás o teu próximo como a ti mesmo.” (Romanos 13:9).
Como é o pecado? A violação dos mandamentos de Deus (1 João 3:4). Antes de chamarmos alguém ao arrependimento, devemos ter clareza de que a ofensa em questão é realmente uma violação da lei de Deus. E antes de começarmos a nos justificar pensando que a lei moral governa apenas nossas ações externas, devemos lembrar do rigor e da espiritualidade dessa lei, conforme explicado por Jesus no Sermão da Montanha (Mateus 5-7). Tanto o ato físico de adultério quanto os desejos sexuais lascivos são violações do sétimo mandamento.
Embora a lei de Deus nunca tenha sido projetada para proporcionar um caminho de salvação para os pecadores, ela nos mostra o que Deus requer.
Isso continua tão verdadeiro para os cristãos quanto para os incrédulos.
Ela também nos ajuda a entender e apreciar tudo o que Jesus nos proporcionou com sua vida de obediência e morte em favor dos transgressores da lei.
É impossível para as pessoas viverem sem padrões de certo e errado. Quando o padrão de Deus, que Ele revelou em Sua lei, é ignorado, negligenciado ou presumido, você pode ter certeza de que outros padrões, feitos por homens, serão impostos. É por isso que as palavras de J. Gresham Machen são tão verdadeiras agora como eram quando ele as escreveu no início do século XX:
“Uma nova e mais poderosa proclamação [da] lei talvez seja a necessidade mais urgente do momento; os homens teriam pouca dificuldade com o evangelho se tivessem aprendido a lição da lei.... É sempre assim: uma visão rebaixada da lei sempre leva ao legalismo na religião; uma visão elevada da lei torna o homem alguém que busca a graça. Ore a Deus para que a visão elevada possa prevalecer novamente.”
© Tom Ascol, 2024. Tradução por Jônatas Cunha.
Publicado com permissão. Texto publicado originalmente em: The Danger Of Ignoring God’s Law | Clear Truth Media
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