Por Esther Engelsma
Durante grande parte da minha vida, não conectei o que comia com a maneira como me sentia. Embora soubesse que comer demais causaria dores de estômago, não prestei atenção em como meu corpo reagia em situações menos extremas a alimentos saudáveis ou menos saudáveis. Então fiz amizade com várias mulheres que tinham alergia a certos tipos de comida. Quando aprendi sobre como elas descobriram o que podiam ou não comer com base na reação de seus corpos, comecei a prestar mais atenção no que comia e como meu corpo reagia. Ao ter o hábito de prestar atenção, comecei a perceber quais tipos de refeições me ajudavam a me sentir bem e enérgica e as que não faziam. Este entendimento mudou a minha alimentação porque estava começando a basear minhas escolhas alimentares em como me sentiria mais tarde, não no que estava desejando no momento.
À medida que minha dieta mudava, comecei a perceber que assim como o que consumia com minha boca formava e alimentava meu corpo, também o que consumia com meus olhos e ouvidos estava formando e alimentando minha mente e alma. Meu corpo não poderia digerir nutrientes de qualidade se eu não estivesse comendo alimentos de qualidade, e minha mente não pensaria em pensamentos santos se não estivesse consumindo as informações adequadas. Os pensamentos que minha mente estava produzindo estavam diretamente ligados a tudo o que eu estava assistindo, lendo e ouvindo. Foi assim que Deus nos criou e por isso Ele dá ordens na Bíblia sobre o que (e o que não) ver e ouvir. Eu tive que considerar o impacto do que estava permitindo entrar em minha mente e questionar se isso se alinhava com as Escrituras ou se precisava mudar minha dieta. Tanto meu corpo quanto minha mente só poderiam digerir o que eu tinha escolhido consumir. Também não poderiam ser renovados a menos que minhas escolhas fossem saudáveis e santas.
O Que Você Consome Molda Quem Você é
Quer estejamos decidindo o que consumir com nossos corpos ou com nossas mentes, há inúmeras opções para escolher. Tudo o que consumimos olhando com nossos olhos ou ouvindo com nossos ouvidos — séries, filmes, vídeos, redes sociais, notícias, livros, revistas e música — é digerido com nossas mentes. Quer percebamos ou não, e querendo ou não, cada imagem, palavra, frase, conversa, postagem e artigo tem um impacto na forma como pensamos. O impacto pode ser muito pequeno, mas quando somado com milhares de outros pequenos impactos, torna-se muito grande. A soma do que estamos consumindo é usada por Satanás para nos conformar com o mundo ou por Deus para nos transformar na imagem de Cristo pela renovação de nossas mentes. Joel Beeke e Mark Jones escrevem:
"Os puritanos alertaram que para resistirmos aos ataques do diabo, devemos guardar o que deixamos entrar em nossas almas pelos nossos ouvidos e olhos".[1]
O que olhamos e ouvimos está moldando como pensamos, o que fazemos e quem somos.
Há algum tempo, comecei a seguir várias contas do Instagram focados no tema do minimalismo. As moças que administravam essas contas compartilhavam fotos e vídeos de como tinham simplificado suas casas e vidas, livrando-se da desordem e mantendo apenas os itens que usavam com regularidade. Depois de algumas semanas seguindo essas contas, fiquei surpresa ao perceber que toda vez que entrava em um quarto na minha casa, minha resposta automática era olhar ao redor para ver se havia algo de que pudesse me livrar. Esse foi o quão rápido meus pensamentos e mente foram "renovados" por informações que estava consumindo por apenas alguns minutos todos os dias.
Este exemplo pode parecer inofensivo, mas pense nas implicações. Não podemos deixar de sermos mudadas pelo que ingerimos. Foi assim que Deus nos criou, e é bom — desde que o que ingerimos esteja nos mudando de uma maneira que nos faça mais como Ele, não mais como o mundo. Mas muitas vezes não percebemos o quão facilmente somos influenciadas, e somos descuidadas com o que consumimos mentalmente. A Bíblia fala de Ló atormentando sua alma ao ver e ouvir os atos ímpios daqueles ao seu redor (2 Pe 2:8), e muitas vezes somos como ele. Colocamos nossos olhos e ouvidos em algo sem perceber que estamos estabelecendo o pensamento de nossas mentes— e, portanto, nossos corações — nisso.
Em suas Confissões, o pai da igreja do século IV, Agostinho, dá um exemplo de um jovem chamado Alípio que foi repelido pela ideia dos jogos selvagens que aconteciam no anfiteatro em Roma. Quando seus amigos o arrastaram para um dos jogos, "ele protestou que mesmo que forçassem seu corpo para dentro, e o segurassem lá, eles não poderiam fixar seus olhos e atenção no que estava ocorrendo". Eles o forçaram a entrar, e quando se sentaram, "ele fechou os olhos para selar sua alma contra este mal". Mas seus ouvidos não estavam fechados, e o que ele ouviu o deixou curioso:
"Aquele grito, entrando em seus ouvidos, fez seus olhos abrirem. A mente, assim, esbofeteada e derrubada era mais precipitada do que estável, e ainda mais fraca por depender de si mesma ao invés de [Deus].... Ele não era mais a mesma pessoa de quando entrou, agora estava inserido na multidão, sendo um com aqueles que o forçaram a entrar lá".[2]
Não somos menos vulneráveis do que Alípio a sermos transformadas pelo que vemos e ouvimos. A diferença para nós é que podemos ver e ouvir quase tudo com um mero clique de um mouse ou toque em uma tela. Satanás sabe disso, e ele o usa a seu favor. Ele torna tão fácil para nós clicarmos e tocarmos sem pensar, seguindo cada link e vontade sem perceber como estamos sendo moldadas. Ele faz tudo o que pode para tornar as palavras e imagens que levarão à morte de nossas almas mais atraentes e empolgantes do que a Palavra da Vida. Ele sabe que mesmo que não nos faça escorregar com grandes pecados, simplesmente encher nosso tempo com palavras e imagens aparentemente inofensivas nos manterá longe do tempo gasto na Bíblia, nos fazendo desprovidas dos nutrientes que precisamos para crescer em nossas vidas espirituais. Para lutar contra o diabo, devemos estar cientes de suas táticas. Assim como eu precisava mudar a maneira como comia focando mais no impacto que os alimentos teriam no meu corpo, então precisamos mudar o que consumimos com nossas mentes, focando mais no que nosso consumo está nos moldando para ser.
Olhe para Cristo
Se você é uma seguidora de Cristo, seu desejo é ser moldada à imagem de Cristo. Isso só acontecerá se você estiver olhando para Cristo ao confiar somente Nele para salvação, buscando-O através da oração, e ouvindo Sua palavra muito mais do que você está olhando e ouvindo o mundo ao seu redor. Em uma época em que um fluxo interminável de informações está constantemente disponível para você olhar, algoritmicamente escolhido para atrair a você especificamente, isso pode ser difícil. Como somos pecadores, pode não parecer fácil ou natural, no início, recorrer a Cristo e à Sua palavra mais do que recorremos a outras formas de mídia. Pode ser preciso esforço deliberado e intenso para começar a escolher ler a Bíblia ao invés de ficar olhando as mídias sociais, ouvir um sermão ao invés de ligar o rádio, ou pegar um bom livro ao invés de clicar em "próximo episódio".
Isso não quer dizer que devemos cortar outras formas de mídia de nossas vidas completamente, mas que devemos ter muito cuidado com nossas escolhas. O que nossas escolhas nos dizem sobre nossas prioridades? Onde estamos gastando nosso tempo? O que podemos aprender ao comparar as estatísticas do nosso tempo de tela diário (em nossos celulares) com a quantidade de tempo que nossas Bíblias estavam abertas em nossos colos? Somos mais influenciadas pelas pessoas que seguimos online ou pelo Jesus de quem dizemos ser seguidoras?
Quando "seguimos" alguém nas redes sociais, clicamos em um botão para que possamos ver automaticamente aquilo que eles postam. Cada vez que postam, aprendemos um pouco mais sobre quem são, como vivem ou qual é a sua perspectiva sobre um determinado assunto. Quando olhamos para seus posts e aprendemos com eles, nossas próprias mentes e vidas são moldadas por eles. Isso não é totalmente ruim. Fomos criadas para ser discípulas, mas devemos ter cuidado para que aqueles que estão nos discipulando estejam indo em uma direção que queremos ir – não sendo conformadas com o mundo, mas sendo transformadas na imagem de Jesus.
O próprio Jesus é o nosso exemplo principal de quem ser, como viver e quais perspectivas manter. Então, como vamos olhar para Ele? Em uma era de “seguir” os outros, como O seguimos? O primeiro passo é simples: estudamos nossas Bíblias. É ali que descobrimos quem Ele é. É onde encontramos as histórias sobre como Ele viveu. É ali que ouvimos as palavras que falou e aprendemos as perspectivas que Ele tinha. Se queremos ser como Ele, é ali que devemos buscar. Michael Barrett escreve:
"Quanto mais vemos de Cristo, mais seremos como Ele.... Se Cristo é o padrão para a santificação, e ser conformado com Cristo é a consequência de vê-Lo, é essencial que olhemos para onde Ele está. O único lugar onde podemos encontrar o verdadeiro Cristo é na Palavra de Deus... Portanto, é vital para nós estarmos na Palavra, diariamente buscando o Salvador. Ele é o nosso padrão de vida".[3]
É assim que podemos lutar contra o apelo do mundo e aprender a amar Jesus cada vez mais. O puritano do século XVII, John Owen, afirma: "Para afastar nossos corações do mundo, devemos fixar nossos olhos em Jesus".[4] Quando vemos o rosto de Jesus aprendendo sobre quem Ele é nas Escrituras, estamos vendo a glória de Deus, e isso nos transforma (2 Co 3:16-18; 4:6). Quando investigamos as histórias de como Ele viveu Sua vida, encontramos forças para correr a corrida de nossas próprias vidas com perseverança (Hb 12:1-2). A Bíblia nos diz "quando Ele se manifestar, seremos semelhantes a Ele, porque haveremos de vê-lo como Ele é" (1 Jo 3:2). Então, por que não ver o máximo possível Dele enquanto ainda estamos na Terra? Por que não prestar menos atenção às palavras do mundo e muito mais atenção à palavra de Deus?
(O texto acima foi extraído do livro "Transformadas: Como Deus Renova Nossa Mente Para Nos Tornar Mais Como Jesus" de Esther Engelsma. Você pode comprar o livro aqui. )
[1] Joel R. Beeke e Mark Jones, A Puritan Theology (Grand Rapids: Reformation Heritage Books, 2012), 863 [edição em português: Teologia puritana: doutrina para a vida (São Paulo: Vida Nova, 2016). [2] Augustine, Confessions, trans. Garry Wills (Nova Iorque: Penguin, 2006), 121. Ênfase acrescentada [edição em português: Confissões (São Paulo: Mundo Cristão, 2019). [3] Michael Barrett, Complete in Him: A Guide to Understanding and Enjoying the Gospel (Grand Rapids: Reformation Heritage Books, 2017), 226. [4] John Owen, Spiritual-Mindedness (Edinburgh: Banner of Truth, 2016), 137 [edição condensada em português: Pensando espiritualmente (São Paulo, Editora PES, 2010).
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